quarta-feira, 9 de setembro de 2015

CONTO OU CRÔNICA? - Antonio Carlos Mangueira Viana

CONTO OU CRÔNICA?


"Pergunta recorrente em minha vida de escritor: você escreve contos ou crônicas? Claro que contos, não sei escrever outra coisa. Sempre respondo que o conto se lê na vertical, a crônica na horizontal (não confundir com outras posições do gênero). No conto, você mergulha quase sempre numa história de alta voltagem, que deve arrastá-lo até o final, sem trégua. Já a crônica é como um passeio por um parque, você começa e vai até o fim sem nenhum sobressalto. Não há preocupação com a densidade psicológica das personagens, isto é, quando se trata de crônicas com personagens. Geralmente ela fala de um fato banal do cotidiano, mas nem por isso ela é banal. É tão difícil escrever uma boa crônica quanto escrever um bom conto. Quem quiser que pense.
O conto deve nos arrastar desde as primeiras linhas para um final nunca dado antecipadamente. Se isso acontecer, o contista fracassou. Surpreender o leitor, eis a sua máxima. Dizem que o bom conto só se resolve mesmo nas últimas linhas. Se for a última palavra, melhor ainda. Mas aí é preciso dominar mil artifícios. As personagens vão se delineando pouco a pouco na mente do leitor, nunca nas primeiras linhas como na crônica. Nesta, elas são dadas com toda clareza, pois o gênero é para ser consumido rapidamente, ninguém vai ficar o resto do dia pensando na crônica que leu no jornal durante o café da manhã. Já o conto, mesmo depois de terminada sua leitura, as personagens ou os fatos podem ficar nos perturbando por horas, dias, meses, quando não anos. Quem nunca leu "A terceira margem do rio", de Guimarães Rosa, leia que vai me entender.
Mário de Andrade dizia que o bom conto é aquele que, ao final de sua leitura, deixa o leitor com o olhar perdido no horizonte.
Espero ter esclarecido de forma sucinta as diferenças entre esses dois gêneros de tão difícil tessitura."






ANTONIO CARLOS MANGUEIRA VIANA

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